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Como avaliar no ensino híbrido?

Passada a fase do ensino remoto emergencial, é hora de mergulhar de vez no ensino híbrido e planejar as avaliações on-line e presencial de forma integrada. Veja como se adequar.

Texto Lilian Bacich e Leandro Holanda

Ensino híbrido é uma abordagem que integra o ensino on-line e o presencial a partir de uma proposta de personalização das experiências de aprendizagem, valorizando a avaliação formativa e o estudante no centro do processo. É fundamental reforçar que, em 2020, vivenciamos, na maioria dos estados e municípios, o ensino remoto emergencial, pois a característica era a entrega dos conteúdos, a oferta de interações e as demais ações que aconteciam sem que os estudantes estivessem presentes no espaço físico da escola. Para 2021, a perspectiva é o ensino híbrido, em que o que acontece de forma on-line/remota se conecta com o que ocorre presencialmente na escola. Nessa definição, apoiada em autores que pesquisam a temática há mais tempo, o ensino híbrido requer a presença física do estudante na instituição de ensino.

Nos Estados Unidos e em outros países que adotam essa abordagem, desde 2006, há oferta de diferentes modelos de ensino híbrido na Educação Básica. Essas implementações ao redor do mundo inspiram, em 2014, a experimentação dessa abordagem no Brasil, com um grupo na Educação Básica (do qual os autores deste texto participaram), com 100% dos alunos frequentando presencialmente a escola. Nesse contexto, os modelos de ensino híbrido que mais se adequavam a essa realidade eram os modelos sustentados: sala de aula invertida, rotação por estações e laboratório rotacional. Em 2021, com o retorno parcial dos estudantes às instituições de ensino, há possibilidade de oportunizar a aprendizagem significativa com modelos mais disruptivos, como flex e virtual aprimorado.

É importante lembrar que, em virtude da diversidade de contextos em que as instituições escolares brasileiras estão inseridas, a etapa on-line (ou remota) do ensino híbrido assume os mais variados formatos: alguns alunos têm acesso ao conteúdo por meio dos ambientes virtuais de aprendizagem, enquanto outros acessam por diferentes meios, como rádio e TV ou até mesmo material impresso. O fundamental, em qualquer dos cenários, é que sejam:

  • identificadas as habilidades essenciais a serem trabalhadas com os estudantes;
  • mapeadas as formas de coletar as evidências de aprendizagem;
  • desenhadas situações de aprendizagem, a partir da coleta de dados, que possibilitem aos alunos — quando face a face com o professor (presencialmente ou via comunicação síncrona para os casos de reabertura parcial) — aprimorar o conteúdo, partilhar experiências, resolver problemas e colocar em ação os aprendizados construídos remotamente.

Avaliação formativa no ensino híbrido

Quando pensamos em ensino híbrido, logo nos vem à cabeça o design de experiências de aprendizagem que proporcionem ao estudante avançar pelos conteúdos de acordo com seu ritmo, tempo e interesse. Para tanto, faz-se necessário avaliar o processo, visto que, entendendo de que forma os alunos aprendem mais e melhor, é possível repensar trajetórias e desenhar percursos formativos personalizados.

Ao longo de uma tradição escolar, as provas sempre foram o principal instrumento para verificar o quanto de conteúdo apresentado por um professor em sala de aula foi retido pelo aprendiz. Com base em uma métrica, seguia adiante quem alcançasse os pontos, ou o conceito, minimamente esperados e era submetido a outros exames, enquanto novas propostas eram apresentadas àqueles que não obtinham “boa nota”.

Essa forma muito comum de coletar dados ignora os diferentes olhares para cada conteúdo trabalhado, desconsiderando, na maioria das vezes, os objetivos e as evidências de aprendizagem. A avaliação formativa é o meio mais coerente para identificar as necessidades dos estudantes e planejar uma aula que vá ao encontro de suas fragilidades e/ou potencialidades, pois:

  • identifica os conceitos construídos pelos alunos sobre o tema a ser trabalhado;
  • analisa os avanços conceituais dos estudantes;
  • verifica, ao final de cada etapa do processo, se os objetivos de aprendizagem foram atingidos. 

Nessa perspectiva, idas e vindas acontecem o tempo todo, replanejando a ação educativa, acertando os rumos a serem tomados, retomando o que for necessário para todo o grupo ou para alguns estudantes. A ação de avaliar, nessa perspectiva, está profundamente conectada com o tipo de experiência ofertada aos estudantes.

Alguns recursos para a avaliação no ensino híbrido

Se já foi dito por que é tão importante a avaliação formativa no ensino híbrido, é hora de pensar como é possível coletar, digitalmente ou não, os dados para desenhar experiências de aprendizagem que estejam de acordo com as necessidades dos estudantes. As possibilidades são as mais diversas: plataformas adaptativas, questionários on-line, debates, observações, interações olho no olho etc.

Algumas dúvidas surgem nesse processo, especificamente porque é preciso conectar ambientes de aprendizagem diversos, em que o que é realizado on-line/remotamente deve se conectar com o que é feito presencialmente. Qual o melhor formato para avaliar os estudantes? Como garantir o levantamento de evidências que representam os avanços? Em que momento realizar as avaliações? É possível garantir que não haverá “fraude”? Diante desses e de outros questionamentos, é primordial lembrar que a avaliação é um processo e não um fim. Por isso, o mais importante é conectar o instrumento avaliativo às experiências de aprendizagem que colocam o estudante no centro do processo, favorecendo a comunicação, o pensamento crítico, a resolução de problemas e a colaboração.

Em linhas gerais, além da conexão com os objetivos de aprendizagem, as habilidades e competências que precisamos desenvolver, é importante considerar evidências que se adaptem à análise que faremos sobre os avanços ou as necessidades dos estudantes. Para isso, é fundamental considerar três aspectos:

  • coerência (compatibilidade entre o modelo de aprendizagem e o que é proposto);
  • abrangência (formatos variados para abarcar experiências de aprendizagem diferentes); 
  • continuidade (informações que permitem monitorar e avaliar o progresso ao longo do tempo).

Com esses aspectos em vista, são organizados instrumentos para a coleta de evidências, que podem ser utilizados tanto no momento on-line/remoto, como no presencial.

Instrumentos avaliativos

A resposta para a nossa pergunta inicial – “Como avaliar no ensino híbrido?” – depende muito da experiência de aprendizagem planejada, mas é necessário que o instrumento avaliativo integre o on-line e o presencial, focando nas conexões e na personalização, o que cria um fluxo contínuo, mas respeitando as características de cada espaço, on-line ou físico. A seguir, seguem algumas possibilidades de avaliação:

  • rotinas de pensamento: ajudam a tornar o pensamento visível, possibilitando desenvolver a visão crítica, reflexiva e aprofundada dos alunos em relação a algo que estejam estudando. Vejo, penso, questiono: rotina de pensamento que pode ser utilizada para dar início ao desenvolvimento de uma habilidade, para identificar os conhecimentos prévios e o que o estudante apresenta de reflexões sobre um objeto de estudo. Conecta, amplia e desafia: rotina de pensamento para encerrar o estudo de um tópico, em que os estudantes comentam como o objeto de estudo se conecta ao que eles já sabiam, como amplia os conhecimentos iniciais e quais os principais desafios. Dicas de recursos digitais: Padlet, Scrumblr, Google Jamboard podem ser usados para sistematizar os resultados dessas rotinas.
  • questionários: coletam informações a partir de perguntas fechadas ou abertas e podem organizar as aprendizagens dos estudantes antes, durante e depois do trabalho com uma habilidade. Dicas de recursos digitais: Socrative, Kahoot!, Mentimeter, Quizlet, Nearpod, Google Forms etc.
  • portfólios: registram não só os resultados de uma aprendizagem, mas também relatos e reflexões dos estudantes em cada etapa do processo. Diários de bordo, representações gráficas (tabelas, mapas conceituais, infográficos, entre outros) e fichamentos podem ser utilizados. Dicas de recursos digitais: Canva e Sway podem ser explorados.
  • rubricas: orientam os alunos sobre o que é esperado deles na realização das tarefas; são conjuntos de expectativas ou critérios bastante claros, organizados em níveis de desempenho, que favorecem a análise de desempenho em uma atividade. Dicas de recursos digitais: RubiStar é uma excelente fonte de pesquisa sobre as rubricas.
  • webquests: possibilitam uma investigação orientada por meio de um processo de construção do conhecimento — a partir de informações multimidiáticas — que favorece o exercício da criatividade, da autonomia e da comunicação. É possível usar e produzir webquests no Sway, no Google sites, no Powerpoint.

Concluindo

Assim, é importante reforçar que as estratégias avaliativas precisam considerar pedagogigamente a implementação do ensino híbrido. O que está por trás dessa implementação é o olhar para o quanto podemos avançar migrando de uma proposta centrada no professor, em que é ele o responsável por “transmitir” informações, lógica do século 20, em que a escola era o local em que era possível obter informações, além das enciclopédias e dos livros na biblioteca, para uma lógica do século 21, em que a escola é o local para a construção coletiva de conhecimentos e onde é possível desenvolver processos cognitivos mais complexos.

Assim, neste momento que estamos vivendo, em uma migração do remoto para o híbrido, o ensino híbrido poderá apoiar um processo que considere os estudantes como protagonistas e que possibilite o desenvolvimento de habilidades e competências que precisamos enfatizar na formação básica.

LILIAN BACICH  é doutora em Psicologia Escolar pela USP e Mestre em Educação pela PUC-SP. Bióloga (Mackenzie) e Pedagoga (USP). É autora de livros didáticos da Moderna. É diretora na Tríade Educacional e coordenadora de curso de Pós-graduação no Instituto Singularidades.

LEANDRO HOLANDA Mestre em Ciências pela USP e especialista em tecnologias educacionais pela PUC-SP. Foi gestor educacional em escolas privadas, e especialista em educação em empresas como a Fundação Lemann, Associação Nova Escola, Microsoft e Moderna. Participou de formações sobre STEM na NSTA em Atlanta e na Universidade de Stanford. É autor de livros e atua ativamente em formação docente. Professor de Metodologias Ativas na pós-graduação do Instituto Singularidades. Professor de curso de extensão na PUC-SP. Cofundador da Tríade Educacional. 

PARA SABER MAIS

  • BACICH, L. Ensino híbrido: modelos que podem apoiar a reabertura das escolas. Blogue Lilian Bacich, Brasil, plataforma on-line, 31 mar. 2020. Disponível em: mod.lk/ed20_nte. Acesso em: 17 fev. 2021.
  • BACICH, L.; TANZI NETO, A.; TREVISANI, F. Ensino híbrido: personalização e tecnologia na educação. Penso Editora, 2015.
  • HORN, M. B.; STAKER, H.; CHRISTENSEN, C. Blended: usando a inovação disruptiva para aprimorar a educação. Penso Editora, 2015.
  • Tríade Educacional — Tutoriais para recursos digitais — www.triade.me/recursos.
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