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O que pais e mães esperam da Educação OnLIFE

Famílias se dividem entre as oportunidades e os riscos da iminente hiperconectividade nas escolas. 

texto  Lara Silbiger

Passado o primeiro susto com a entrada do ensino remoto nas salas de suas casas, pais e mães começam a refletir sobre a evolução da Educação no pós-pandemia. Para a maioria, o avanço da hiperconectividade no ensino — algo que soava a roteiro de ficção científica antes da pandemia — começa a ganhar forma.  

A comparação com a época em que eram estudantes, algumas décadas atrás, é inevitável para pais e mães. Da digressão aos tempos de enciclopédia, eles saltam rapidamente para as oportunidades que agora os filhos têm diante de si. 

Ao vislumbrar uma escola em que a realidade espaço-temporal tende a romper fronteiras e dar acesso a uma infinidade de informações em apenas alguns cliques, as famílias oscilam entre a euforia de ver a atual geração ganhar o mundo por meio dos recursos digitais e da conectividade que os cerca e o receio de ver suas crianças aprendendo em um contexto supostamente menos real do que aquele em que cresceram.        

Para conhecer mais de perto as expectativas de pais e mães, confira os depoimentos de quatro famílias cujos filhos se encontram em diferentes segmentos de ensino. 

Janelas para o mundo 

No pós-pandemia, a experiência, a liberdade e a vontade de se conectar com o mundo jamais sairão de dentro dos jovens. Levarão isso para a sala de aula 

Débora Venturini é mãe de Flora, 16 anos, aluna do Colégio Dante Alighieri 

No início, o ensino remoto na pandemia foi um choque. Mas logo percebi o quão rica poderia ser a aprendizagem em um ambiente conectado e sem fronteiras espaciais.  

A partir de referências que os professores davam, percebi minha filha cada vez mais instigada a buscar informações — inclusive em outros países — sobre os conteúdos das aulas e outros temas de seu interesse. Por exemplo, para um trabalho em grupo sobre lixo, ela pesquisou sobre a produção de saco de lixo feito com cannabis.  

Com as janelas do navegador abertas para o mundo, ela se sentiu mais dona do próprio aprendizado e pronta
para tomar as rédeas de como prefere aprender. Enquanto na minha época de escola eu tinha que me limitar às enciclopédias para fazer pesquisas, minha filha tem o universo à sua disposição.  

De um lado, isso exige muito mais proatividade e autonomia dela como estudante. De outro, ganha mais domínio sobre seu projeto de vida, uma vez que as respostas para o que almeja e planeja partiram de suas próprias descobertas. Isso vale, inclusive, para as escolhas profissionais, que passam a ser mais embasadas.  

No pós-pandemia, a experiência, a liberdade e a vontade desses jovens de se conectarem com o mundo jamais sairão deles. Inevitavelmente, levarão isso para a sala de aula. Chegarão lá transformados e ansiosos para buscar essa costura de ferramentas em um novo modelo de aprendizado.  

Se a pandemia serviu para alguma coisa no âmbito da Educação, foi para quebrar barreiras entre alunos e escolas. Se alguém ainda resistia a esse universo, isso agora cai por terra.

A gente ouve falar de famílias que tiram o celular e o computador do filho como forma de puni-lo pela distração que esses dispositivos podem representar. Ao meu ver, é um erro. O risco é a criança achar que o mundo que a conectividade abre não a levará a lugar nenhum. É evidente que precisamos de horário e limites para tudo na vida. Mas também é claro que as tecnologias digitais podem nos levar para o mundo.  

Às escolas cabe aprender a lidar com a realidade OnLIFE. Aos alunos e às famílias, se adaptar a tudo isso para colher um aprendizado sem fronteiras, em que tudo — ou quase tudo — poderá ser feito de forma coletiva e on-line, sem ter que abrir mão do convívio em grupo.  

Protagonismo do aluno 

O on-line revelou para os pais um novo jeito de aprender, muito mais centrado no papel ativo do aluno

Helen Hirahara é mãe do Henrique, 12 anos, aluno do
Colégio Carbonell 

Tenho que confessar que, à primeira vista, o ensino remoto na pandemia foi um choque. Embora já tivesse ouvido falar de Educação a Distância (EaD), não podia imaginar que algo parecido pudesse funcionar para crianças. Duvidei. Com o passar dos meses, fui percebendo que estava errada.   

A atual geração já nasceu com um celular ou um tablet na mão. Aqui em casa, por exemplo, sempre deixei meu filho muito à vontade para jogar videogame e usar o computador — sempre explicando, claro, que tem hora para tudo.  

Para além do lazer, o ensino remoto na pandemia mostra às famílias que o uso de recursos digitais é uma forma de desenvolver competências e responsabilidades nos estudantes. O on-line revelou para nós um novo jeito de aprender, muito mais centrado no papel ativo do aluno.

Recentemente, meu filho teve uma aula de Matemática toda ambientada em um jogo de Escape. Para engajar a turma, o professor usou um aplicativo educacional para apresentar exercícios sobre números múltiplos e sequências e abrir caminho para o aprendizado de divisibilidade. Em tempo real, os alunos tiraram as dúvidas. Na última fase, assistiram a um vídeo produzido pelo professor — e embedado no aplicativo — e responderam perguntas com base naquele conteúdo. Meu filho adorou!  

Minha expectativa sobre a hiperconectividade no futuro da educação, com as tecnologias digitais tornando o aprendizado ainda mais produtivo e os educadores guiando os alunos na busca pelo conhecimento, não é unânime. Ainda há famílias revoltadas com tanta modernidade. Alguns chegam a dizer que pagam o professor para ensinar e que preferem que os filhos aprendam de forma tradicional. 

Negar o avanço digital é impensável para mim. Meu único receio, porém, é garantir que as crianças saibam lidar também com a vida não conectada. Às vezes me pergunto: esta geração saberia pesquisar se não fosse pelo Google? Queiramos ou não, a vida off-line
sempre vai existir e vai coexistir com a vida
on-line. É dever da escola e das famílias mostrar que esses dois mundos podem e devem coexistir. 

Oportunidades e desafios de educar para o futuro 

Quando a escola se apropria e se insere com equilíbrio no mundo digital, o resultado são crianças mais preparadas para o futuro

Douglas Kayassima é pai da Luiza, 6 anos, aluna do Colégio Guilherme Dumont Villares

Antes da pandemia, já era possível ver a tendência de crescimento do ensino remoto ou a distância, principalmente para Graduação, Pós-graduação e Cursos de Extensão. Mas eu achava inimaginável aplicar o uso intensivo de tecnologia na Educação Infantil. 

Quando começou o ensino remoto, com a minha filha em fase de pré-alfabetização, fiquei surpreso com o quanto é possível evoluir trazendo tecnologias digitais para as aulas on-line.  

Com sites e aplicativos que incentivam e engajam as crianças, ela aprendeu com jogos e vídeos lúdicos. Além disso, nas aulas, os professores usam recursos on-line para ilustrar o tema e indicam links para aprofundamento do conteúdo. 

Depois de tudo isso, a hiperconectividade na Educação se provou um caminho sem volta. Quando a escola se apropria e se insere com equilíbrio no mundo digital para potencializar o aprendizado, o resultado são crianças mais preparadas para o futuro. 

Entretanto, também vejo um desafio. O uso excessivo de tecnologias digitais e hiperconexão tende a relegar as atividades manuais a segundo plano. Isso pode impactar o desenvolvimento da criatividade, da imaginação e da coordenação motora.  

Para mitigar riscos como esse, o colégio da minha filha mescla recursos on-line com atividades manuais. Em paralelo, valoriza o convívio do grupo e orienta as crianças sobre o uso moderado e consciente das telas. Já nas reuniões de pais e mestres, incentiva o reforço da convivência com os filhos, com mais tempo de brincadeiras e passeios e limitação do tempo diante das telas.  

Riscos  

Corremos o risco de perder as sensações, os processos, a calma, o olhar daquilo que se constrói aos poucos – e não em cliques

Cecília Santos* é mãe da Camila*, 11 anos (*os nomes foram alterados a pedido da fonte)

Durante a implantação do ensino remoto na pandemia, a escola da minha filha trouxe um palestrante que apresentou para as famílias uma nova visão sobre jogos on-line, construções coletivas — por exemplo, de cidades virtuais — e de como tudo isso contribui para a criança desenvolver uma noção espacial diferenciada. Ele nos fez refletir sobre o trabalho em grupo nesta nova realidade hiperconectada, que abre espaço para a colaboração e o desenvolvimento conjunto da criatividade onde quer que os participantes estejam.  

Hoje a minha filha tem a oportunidade de passar horas conectada com uma amiga da escola, desenvolvendo um projeto juntas cada uma em sua tela. A conectividade trouxe para a Educação uma nova possibilidade não só de convívio como de acesso a um universo infindável de informações.  

É claro que tantas possibilidades vêm acompanhadas de desafios. Corremos o risco de perder as sensações, os processos, a calma, o olhar daquilo que se constrói aos poucos — e não em cliques. Temo por essa tendência e expectativa de que tudo aconteça de forma rápida, imediata. 

Tem também desafios éticos. A Educação OnLIFE precisará olhar para questões de privacidade, de respeito ao outro e do narcisismo diante das telas. Se já vemos adultos vivendo como se fosse quase para justificar a vida digital, como lidar com o desenvolvimento das crianças na era da hiperconectividade? 

Como minha filha estuda em um colégio que preza mais por recursos analógicos que pelos tecnológicos, fico preocupada com o quão criteriosos serão na adoção de novas tecnologias digitais e imersão na hiperconectividade.  

Por outro lado, escolas que já estão se preparando para abraçar esse novo cenário talvez tragam para os alunos a oportunidade de serem educados e de viverem agora um mundo que será realidade.  

Estudante 

Com o cenário imposto pela pandemia, a Educação OnLIFE tornou-se algo muito mais real para mim

Flora Venturini Ribeiri, aluna do 2o ano do Ensino Médio no Colégio Dante Alighieri

Hoje a minha vida está atrás de um computador: meus estudos, minhas provas, tudo. Esse formato me levou a ser mais curiosa e me deu mais autonomia para não ficar apenas com as explicações do professor.    

Se essa conversa fosse em 2019, diria que uma sala de aula com atividades on-line era totalmente futurista. Com o cenário imposto pela pandemia, a Educação OnLIFE tornou-se algo muito mais real para mim.  

É uma sala sem fronteiras, onde os alunos, levados por seus interesses, podem ultrapassar os limites do ensino tradicional e aprender ainda mais sobre o que o professor nos apresenta.  

Além disso, o conhecimento chega até nós de forma muito mais rápida e fácil. Até porque os próprios alunos se ajudam, compartilham ideias, posts e pesquisas. Isso nos une como grupo, mesmo estando a distância. 

Meus professores, colegas e eu já estamos preparados para isso, mas sei que infelizmente ainda não é a realidade de muitos estudantes no país.


LARA SILBIGER é jornalista graduada pela Universidade de São Paulo, com pós-graduação em Comunicação Audiovisual na Era Digital pela Universidade de Santiago de Compostela (Espanha) e atuação em redações de veículos de grande circulação. Desde 2002, cobre a área de Educação. Entre 2013 e 2019, dirigiu os web documentários das edições anuais do Prêmio Arte na Escola Cidadã, promovido pelo Instituto Arte na Escola.  

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