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Especial Metodologias ativas | Formação professores

O desafio de formar o educador do século XXI, conectado às demandas de uma geração cada vez mais digital.

Por Zilda Kessel

Se você é usuário das redes sociais, em especial do Twitter em que uma ideia é expressa em somente 140 caracteres, certamente já ouviu a expressão Trending Topics. Traduzindo, são os “tópicos em tendência“, os temas mais comentados. Já deve ter ouvido falar também sobre a ferramenta Google Trends, que mapeia os temas mais pesquisados no Google.

Se tivéssemos ferramentas como estas para descobrir os assuntos mais falados da área de educação, o termo “metodologias ativas” estaria entre os trending topics de hoje. Parece, de repente, que ele está no foco de educadores, pensadores, especialistas e, também, dos vendedores de novidades da área.

A educação não está imune aos conceitos que entram e saem da moda. Vimos conceitos fundamentais, como interdisciplinaridade, transdisciplinaridade, construtivismo, sustentabilidade, estilos de aprendizagem, inteligências múltiplas, currículos e avaliação por competência, pedagogia de projetos, pilares (ufa!), serem iluminados e relegados com a rapidez de um verão. Não por serem descartáveis, muito pelo contrário, mas por serem citados para tudo e por todos como solução simples para as complexas questões impostas aos que pensam e que atuam na área.

Outro movimento comum na educação envolve os conceitos que aparecem como grande novidade e que, na verdade, foram propostos e construídos ao longo do tempo. Ao sermos apresentados às pretensas novidades, pensamos: “mas eu já ouvi isso” ou “eu já faço isso”. Por isso, para abordar o conceito das metodologias ativas, convido você a um olhar em perspectiva. O exercício nos ajuda a compreender a importância de abordar a educação como um ato contínuo, como um processo gradual que se constrói pouco a pouco com as contribuições e experiências de muitos, fruto de uma práxis, do pensar unido ao fazer, do avaliar e rever. Muito mais do que achar que trabalhamos num grande mercado de novidades, vale colocar as nossas experiências e reflexões em contexto e entender que contribuímos coletivamente para a construção educativa.

As metodologias ativas compreendem a experiência e a ação dos alunos como elementos decisivos para a aprendizagem. Elas se opõem ao modelo baseado na transmissão, pelo professor, dos conteúdos a serem memorizados pelos alunos.

A valorização da experiência como elemento de aprendizagem emerge no contexto do século XVIII, na Europa e nos Estados Unidos, cenários das revoluções liberais e das ideias de independência, respectivamente. O estudante é reconhecido como indivíduo, cidadão portador de direitos. Um dos precursores na construção teórica e na prática dessas ideias foi o suíço Johann Pestalozzi (1746-1827), que fundou, em 1805, uma escola com um currículo voltado para as atividades dos alunos. Ele influenciou outros educadores como Herbart (1776-1841) e Froebel (1782-1852), este último foi quem cunhou o termo “Jardim da Infância”. Froebel propôs que a escola fosse um espaço de desenvolvimento para as crianças, comparando-as às plantas que crescem e se desenvolvem com vigor em espaços apropriados. Para isso, jogos e brinquedos selecionados garantiriam o desenvolvimento dos pequenos por meio da ação do brincar.

A ideia de que a ação, em contextos previamente organizados e com objetos adequados, promove a aprendizagem também está presente nas propostas de Maria Montessori (1870-1952), psiquiatra italiana que colocou a atividade das crianças no centro da aprendizagem. Um ambiente desafiador proporciona, na visão montessoriana, a autoeducação e autonomia das crianças. Neste ambiente, os professores atuam como orientadores e facilitadores, mas a aprendizagem é um processo individual e autorregulado. As classes reúnem alunos de diversas idades e em nada se parecem com as salas de alunos enfileirados, em silêncio, ouvindo o professor e realizando atividades idênticas.

Contemporâneo de Maria Montessori, Celestin Freinet (1896-1966) teve uma
contribuição fundamental para fortalecer a importância do fazer para aprender. Para ele, no entanto, a ênfase estava no trabalho e na cooperação em atividades conectadas com o mundo a volta da escola, muito mais do que em materiais específicos, como propuseram Montessori e Froebel. Foi Freinet que mostrou a importância de os alunos estarem em contato com o ambiente e com as comunidades que os cercam, conhecendo realidades e histórias, que se transformavam nos jornais produzidos pelos próprios alunos e partilhados com outras escolas. Usando as tecnologias de seu tempo, como tipografia e o correio, o educador francês propôs metodologias ainda atuais. Para ele, o ambiente da escola deveria se assemelhar a um espaço de trabalho, em que professores e alunos atuassem para produzir e realizar, com criatividade e cooperação, um produto que teria sentido e finalidade para todos.

O americano John Dewey (1859-1952), outro contemporâneo de Montessori e Freinet, em sua vasta produção, durante quase um século de vida, explicitou a importância da ação, do fazer, como elemento fundamental da aprendizagem. Ao propor que a escola não era o lugar de preparar jovens para a vida, senão a própria vida, mostrou a relevância dos desafios da vida real, das questões complexas, cuja solução teria sentido tanto para o aluno como para a sociedade em que vivia. Dewey defende que somente a participação do estudante em uma atividade de interesse comum, dele e da sociedade, pode proporcionar a aquisição do saber intelectual articulado ao sentido social. Portanto, toda a aprendizagem deve ser integrada à vida, adquirida em uma experiência real, em que o aprendido na escola tenha o mesmo lugar e função que tem na vida. Para ele, só se aprende o que se pratica. Por isso, o currículo precisa ser organizado por experiências construídas e reconstruídas.

O valor dado a experiência também está presente no pensamento de outro americano, o psicólogo Carl Rogers (1902-1987). Por meio de atos, o aluno adquire aprendizagem mais significativa. Assim, é preciso que a escola coloque o estudante em confronto experiencial direto com problemas práticos, de natureza social, ética ou pessoal. O estudante aprende quando participa do seu processo, faz escolhas em função de desejos e interesses pessoais, em que estão presentes cognição e afeto. Para Rogers, aprendizagem fundamental é o próprio processo de aprendizagem. Ele defendeu a ideia do professor como facilitador dos caminhos individuais e coletivos de aprender, aquele que proporciona um ambiente adequado à emergência dos interesses individuais e dos grupos, que contribui para que seus alunos encontrem indagações e interesses significativos e que se empenha para que tenham os meios e os recursos necessários para percorrer suas trajetórias. O professor torna-se, ao lado de seus alunos, um aprendiz.

Vale lembrar que esse conjunto, extenso ainda que incompleto, de contribuições de que somos herdeiros, influenciou, na década de 1930, os intelectuais brasileiros que publicaram o Manifesto dos Pioneiros da Educação, com a proposta para mudanças significativas no país. Ali, há quase 90 anos, já encontramos menções à importância da ação e da experiência para a aprendizagem. Vemos, portanto, que as metodologias ativas já estão presentes há muito na formação do pensamento pedagógico. Então, afinal de contas, o que as traz de volta aos trending topics?

As metodologias ativas em um mundo conectado

Numa sociedade totalmente conectada em que a informação vem em fluxo e em que os saberes necessários à vida e ao trabalho se modificam rapidamente, as capacidades de autorregulação, de aprender e organizar a própria aprendizagem e atuar sobre questões novas e problemas complexos só pode ser desenvolvida numa escola que garanta a aprendizagem ativa, o fazer, o experimentar. Arrisco a dizer que as metodologias ativas são o caminho possível para garantir a aprendizagem significativa, sobretudo num tempo em que a maior competência a ser aprendida não é mais a absorção de muitos conteúdos, mas a capacidade de ler e aprender ao longo de toda a vida. É no século XXI que metodologias ativas, propostas há mais de um século, encontram um ambiente propício para serem desenvolvidas, diante da crise que a escola tradicional e conteudista enfrenta e que busca novos desenhos.

Arrisco, ainda, a propor que as tecnologias digitais e a vida em rede, marcos da contemporaneidade, trazem para as metodologias ativas uma série de novas possibilidades de interação e, ao mesmo tempo, proporcionam aos estudantes construir caminhos individuais a partir de seus interesses e competências. Espaços de fazer, próprios da cultura maker, programas de imersão, simulações e experimentações, prototipagem e realização de projetos com tecnologia, acesso à informação são alguns exemplos de articulações possíveis das metodologias ativas com as tecnologias digitais. O desenho de um professor que fala para uma classe dá lugar a diferentes alunos, articulados, presencialmente ou a distância em espaços de interação, em que têm acesso a informações, programas e ferramentas com os quais criam percursos e respostas significativas. Interagem com conteúdos em ritmos e processos próprios, podendo coordenar sua aprendizagem. Isso vale tanto para conteúdos específicos e limitados, com os quais cada aluno se relaciona, como para projetos complexos que integram áreas de Arte e Ciências, grupos de trabalho e tempos mais longos.

E como formar professores para atuarem em ambientes e processos tão diversificados? Vejo que o caminho é a formação dos educadores nas mesmas condições em que irão atuar. Não é possível formar professores facilitadores desses processos em aulas expositivas ou transmissivas. Não é possível ensinar professores a contribuírem para que seus alunos sejam curiosos, lidem com questões complexas, desafios cujas respostas não foram ainda dadas sem que os próprios professores tenham que lidar com elas. É preciso que enfrentem o ‘não saber’, o desafio da dúvida, da investigação, de ser aprendiz e compreender o erro e o ensaio como partes decisivas para a aprendizagem. É necessário colocar em jogo vários conhecimentos e saberes, para além das suas disciplinas. Precisam saber fazer escolhas de conteúdos, tanto quanto de fontes e de processos e metodologias. E precisam desenvolver, assim como os seus alunos, as competências para aprender ao longo de toda a vida, já que as certezas e os saberes estáveis duram cada vez menos e o que permanece é a nossa capacidade de compreender e reconstruir as nossas experiências todos os dias.

Costumo dizer aos educadores da escola em que atuo como coordenadora de Tecnologia Educacional, que, diariamente, ao me levantar, sei que novos aplicativos, programas e metodologias foram lançados enquanto eu dormia. E para me apropriar de alguns deles, o que está em jogo é conseguir lidar com a ideia (e também com a angústia) de que ainda não os conheço, mas posso experimentá-los e aprender a usá-los. Que posso encontrar parcerias para partilhar comigo as indagações e as experiências. Que o que aprendi em experiências anteriores, assim como a aprendizagem de pesquisa e reflexão que acumulei ao longo dos anos, me permitem articular esses novos dispositivos aos objetivos que temos como educadores.

O novo é matéria-prima no diálogo com as nossas experiências. E que não nos limitemos a transmitir conteúdos, mas construir as competências que levaremos para aprender a vida inteira. E elas dependem da experiência e do fazer. Mãos à obra: ao erro, ao acerto provisório, ao fazer e refazer, como aprendizes educadores. Esses são os trending topics do nosso tempo.

Zilda Kessel
é educadora, mestre em Ciência da Informação e Comunicação (ECA/USP) e doutora em Currículo-Novas Tecnologias em Educação (PUC/SP). Atuou como professora em cursos de Pedagogia e Licenciatura, na Faculdade Singularidades e no Senac/SP e nos projetos educativos do Museu da Pessoa, Instituto Itaú Cultural e Portal NET Educação. É coordenadora de Tecnologia Educacional da Beacon School.

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