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Lendo as janelas do mundo

Uma reflexão poética sobre o papel da cultura, da educação e das experiências sensoriais na formação do leitor crítico e empático.

Texto  Ivan Aguirra

Muito se fala sobre nossas relações familiares e as heranças compartilhadas desses laços. Uma das coisas de que tenho mais orgulho são as memórias sensoriais de tudo o que vivi na infância. E a música é uma delas. Particularmente, algumas me marcaram como trilha sonora em casa e me fizeram o ser humano curioso e observador que escreve agora: uma delas é “Paisagem da janela”, de Lô Borges e Fernando Brant, cantada na voz de Beto Guedes. Lembro-me perfeitamente de estar na maternidade com meu irmão recém-nascido nos braços da minha mãe, enquanto o rádio-relógio cantarolava e o vento fazia as cortinas dançarem pelo quarto.

Mas hoje quero realçar uma canção atual para o menino que lia as janelas do mundo de outrora, lançada em 1992 e que fez parte do meu cotidiano, não pelo universo infantil, mas das influências da criança que transitava pelo cenário das coisas adultas. Adriana Calcanhotto eternizou “Esquadros” para reverberar como lê e sente o mundo, integrando cultura, questões sociais e sua individualidade.

Sempre achei que isso diz muito sobre a leitura de mundo, que precede a própria leitura da palavra. A criança que lê, questiona e pergunta na sala de aula é a mesma que ouve, convive, reza, influencia e é influenciada pelas raízes familiares e pela cultura (oral, letrada, digital), consome e constrói todo o tipo de imagens e textos, curte, compartilha e busca significado, também, fora da escola, desde a primeira infância.

Assim como Adriana e todas as crianças do mundo, “eu ando pelo mundo prestando atenção em cores que eu não sei o nome / Cores de Almodóvar / cores de Frida Kahlo / cores”. Mesmo antes de problematizar ou sequer conceituar, a criança que ecoa nos corredores da escola traz vivências ricas de sentido, que permitem tanto ao aluno quanto ao professor aprenderem. E é nessa mediação diversa que a faísca da transformação se faz, expandindo os enquadramentos de percepção de mundo, as leituras enviesadas pelo algoritmo, os recortes de realidade e as diferentes comunidades.

Ao extrapolar as janelas de sua própria realidade, sempre é possível encontrar uma compreensão melhor das realidades, contribuindo para uma sociedade mais consciente e sensível às múltiplas formas de viver e perceber o mundo. 

Em uma sociedade que se reinventa na velocidade do vento, pela primeira vez temos o receio e a insegurança de educar uma geração para um mundo que trará premissas e paradigmas nunca pensados ou vivenciados pelo cérebro humano. Faz-se mais do que necessário aprender e ensinar a ler o mundo com a criatividade que só as crianças sabem ter.


Para saber mais

  • “ESQUADROS”. Adriana Calcanhotto (Senhas). Rio de Janeiro: 21 de julho 1992. YouTube, 9 nov. 2014. 1 vídeo (3min 9s). Disponível em: https://mod.lk/ed27_sb1. Acesso em: 19 ago. 2025.
  • “PAISAGEM DA JANELA”. Clube da Esquina (O Clube da Esquina 1972). São Paulo: 3 de janeiro de 1972. YouTube, 25 jul. 2019. 1 vídeo (2min 58s). Disponível em: https://mod.lk/ed27_sb2. Acesso em: 19 ago. 2025.

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